Educação Linguística: por onde começar?
- marina.grilli.s
- 2 de mai. de 2022
- 3 min de leitura
Atualizado: 26 de jun.
Se você chegou até este texto, provavelmente já sabe o que é Educação Linguística: uma abordagem do ensino de língua que leva em consideração as relações de poder que permeiam a língua como prática social, e que reconhece a necessidade de trazer para a aula de língua a realidade de quem aprende essa língua no Brasil.

Mas e agora? Como é que a gente coloca tudo isso em prática?
Eu sempre comento com quem aprende comigo que a missão de construir a cultura da Educação Linguística no Brasil é um tanto quanto árdua - e, por isso mesmo, essencial e gratificante.
Porque vivemos em um país de herança colonial forte demais.
Porque, assim como outros direitos humanos, os direitos linguísticos não são garantidos ao povo brasileiro, e sim, apenas a um pequeno grupo de pessoas privilegiadas.
E porque a educação por aqui é muito sucateada, fazendo com que professores muitas vezes não disponham de tempo ou energia para buscar atualização constante.
Devido a todo esse histórico, um ensino de línguas voltado para as necessidades reais do povo brasileiro, e não para se submeter a diretrizes enlatadas da Europa ou Estados Unidos, ainda é uma proposta considerada inovadora... até demais.
A boa notícia nisso é que existe muito, mas muito campo de exploração para quem quer superar o ensino de línguas colonizado e colonizador, representado por:
materiais e métodos elaborados sob a perspectiva colonizadora,
um ensino focado em conhecer e se comunicar com falantes que nasceram nos países hegemônicos,
a orientação monolíngue, que desconsidera e/ou reprime o convívio de outras línguas no espaço de aula,
a fixação pelos níveis do Quadro Comum Europeu acima da livre expressão.
Transgredir o conservadorismo na língua e na educação é um princípio inegociável para construir Educação Linguística de verdade. É só a partir daí que podemos planejar um jeito de ensinar que gere interesse em quem quer aprender, sem se fechar em uma caixinha desconectada da realidade.
Sim, existe muita gente que se desenvolve na nova língua apesar dos padrões de ensino coloniais - o problema é que essa porcentagem de aprendizes do Brasil que têm sucesso em uma língua de prestígio é baixa demais.

E o único jeito de mudar essa realidade de fracasso é voltar os nossos olhares para essas pessoas que estão lutando tão arduamente para aprender uma nova língua, trazendo consigo não só dificuldades e bloqueios, mas toda uma complexa história de vida - que pode e deve, sim, ser usada para facilitar a aprendizagem, e não para torná-la ainda mais difícil.
Somente ao reconhecer aprendizes em toda a sua complexidade de seres humanos, seremos capazes de fomentar a consciência crítica sobre o uso da língua, e sobre o papel que a língua representa nas estruturas sociais.
Não é difícil pensar em exemplos de como fazer isso:
ensinar gramática de maneira contextualizada, chamando atenção para as possíveis falhas de interpretação que o mau emprego de certos termos pode gerar;
incentivar e celebrar a expressão na nova língua a todo momento, sem colocar a correção gramatical em primeiro plano;
ensinar pronúncia com foco na compreensão de todo e qualquer falante do mundo, em vez de imitar "o nativo" e tentar agradar "o nativo";
fomentar a reflexão crítica sobre as representações de casa, trabalho, família e papéis de gênero nos materiais didáticos, sobretudo os importados.
Essas ideias iniciais servem como ponto de partida para uma reflexão decolonial. A gente aprofunda todas elas, com embasamento teórico atualizado e estratégias práticas para um ensino leve e eficaz, aqui na Formação Além da Língua.
Afinal, como é que vamos educar linguisticamente para o pensamento crítico, se não soubermos pensar criticamente?
Este texto foi escrito em linguagem neutra de gênero. Doeu? ;)